segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

"DESAFIO PARA A POLÍCIA - Venda de sexo se expande no corredor da Praia de Iracema"

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Os pontos de prostituição de mulheres e travestis acontecem, inclusive, na calçada de uma delegacia de polícia
FOTOS: NATINHO RODRIGUES
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A "oferta" de estrangeiros faz com que a Praia de Iracema resista como principal foco de comércio do sexo e das drogas ilícitas
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Exibicionismo é a atitude adotada por muitas mulheres nas boates da Praia de Iracema, de modo a atrair a clientela estrangeira
14/2/2011

Ação policial inibe exploração sexual de crianças e adolescentes, mas é menos efetivo com a prostituição
Foi-se o tempo em que a Praia de Iracema era conhecida como reduto da boemia cearense, lugar que reuniu os primeiros porto e armazéns atacadistas, sempre obteve o reconhecimento de moradores e visitantes da nossa cidade.

O que não se contava é com o nível de decadência, que fez o bairro fechar pontos comerciais, afastar famílias e se tornar um ponto de quase somente uma das grandes casas que ainda não foi envolvida pelas ondas da quebradeira, o Pirata, do comerciante Júlio Trindade.

Trindade, como outros comerciantes, tem resistido, mas não nega que os anos seguidos de abandono foram de prejuízos inestimáveis.

"Tudo aqui ficou comprometido. A segurança, o valor dos imóveis", disse o engenheiro civil José Humberto Dávila, de 36 anos, que reside há quatro anos na Praia de Iracema. Aqui o que não foi atingido foi o comércio das drogas e do sexo", ressalta.

A polícia não nega o superdimensionamento da criminalidade. "Infelizmente, temos aqui algumas casas noturnas que propiciam a prostituição. Esse é um problema antigo, que procuramos combater de todas as formas, fazendo operações, pedindo o apoio da Prefeitura de Fortaleza, que compete conceder o alvará de funcionamento desses estabelecimentos".

A afirmação é da titular da Delegacia de Proteção ao Turista, Adriana Arruda, ao avaliar o crescente processo de degradação da Praia de Iracema. Para a delegada, a lógica apontaria que se houvesse vontade política, essa atividade seria combatida a partir do momento em que não se concederia o alvará de funcionamento.

A violência é que mais causa perplexidade a seus moradores, comerciantes e, inclusive, à Policia. Adriana lembra que a Polícia se encontra, até o momento, investigando um homicídio que aconteceu na porta de uma boate, a Café del Mar.

"Então, temos aqui o tráfico de drogas e os assaltos. O próprio dono de uma boate já foi assaltado. Então se você colocar tudo isso num prato, vamos ter uma variedade de atentados contra a segurança do cidadão, inclusive da moral", afirma a delegada. A situação mais vexatória para a Polícia é o fato de que prostitutas e travestis fazem ponto em frente a Delegacia. "Se a gente pede para que saia, tem como resposta de que a rua é pública e que fica onde quiser", disse.

Para a Polícia, inclusive o GGI, o alvo principal é o fato de existir uma rede, em que a prostituição é apenas um de seus tentáculos. Drogas e assaltos se somam às atividades criminosas, impondo medo e afastando cada vez mais os cidadãos. De acordo com o secretário executivo do GGI, tenente-coronel Domingos Sávio Fernandes de Brito, a pedofilia ainda é um problema, não apenas na Praia de Iracema, mas ainda na Barra do Ceará e em outras regiões costeiras do Estado.

Para a polícia, há todo um grupo de pessoas que sai no lucro, desde os taxistas aos donos de boates, passando pelas prostitutas e os estrangeiros.

"Se somente os homens pagam nas boates e as mulheres têm acesso livre e bebidas de graça sem limites, há favorecimento para a prostituição. Para o proprietário da casa, a lógica funciona assim: quanto mais mulheres mais homens em busca de sexo serão frequentadores", observa Adriana.

Para o tenente-coronel Brito, toda a ação policial (envolvendo a Polícia Federal, a Abin, a Secretaria de Segurança Pública e a Prefeitura de Fortaleza) tem sido eficiente. Na sua avaliação, tanto é verdade que a frequência do turista estrangeiro na Praia de Iracema é bem menor, se comparada há dois anos atrás.
Todos ganham

As boates atraem o estrangeiro e a prostituta. E, para a Polícia, todos ganham: a prostituta, o estrangeiro que vem aqui em busca da prostituição e os donos das casas, que oferecem toda a infraestrutura para as mulheres, não cobrando entrada, fornecendo bebida de graça.

Embora a Delegacia de Proteção ao Turista atue mais na questão do visitante como vítima, há também uma relação muito forte com as prostitutas. Uma denúncia comum, conforme a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), é quando envolve o estrangeiro e a mulher de programa. Trata-se do chamado "boa noite cinderela", que dopa através de comprimidos diluídos em bebidas alcoólicas.

Essa prática acontece com a mulher, geralmente, levando o cliente para o seu local de hospedagem, seja um quarto de hotel, ou uma casa alugada por temporada ou que seja um motel e esse turista é dopado. Então, acontecem os roubos e problemas graves, inclusive casos de morte por overdose. As mulheres que fazem programas são, em geral, pessoas de baixa renda, a maioria ex-babás, ex-domésticas, que passaram, a contar com uma renda maior.
Fique por dentro TRADIÇÃO

Embora seja um ponto tradicional na Praia de Iracema, as mulheres de programa se movimentam ao sabor da demanda. De acordo com os relatórios do GGI, cada vez mais as praias do litoral cearense passaram a contar com mais pontos de prostituição, aproveitando, inclusive, a migração de mulheres de Fortaleza e Estados vizinhos. Numa lógica que acompanha o submundo, como o estrangeiro encontra-se em grande número em outras praias, tal como acontece em Canoa Quebrada, Jericoacoara e até mesmo nas praias da Região Metropolitana, como Prainha e Cumbuco, o fluxo se intensifica nesses locais. Para isso, há uma atração para o tráfico de drogas e para a prática de crimes contra o patrimônio. Antes o estrangeiro aparecia apenas como vítima, hoje se configura também como autor de práticas criminosas.
SERES HUMANOSTráfico doméstico supera movimento internacional

É como se as mulheres estivessem numa vitrine e, de longe, lembrasse a sofisticação do que acontece em lugares como o Red Light, em Amsterdã, na Holanda. Mas é só uma remota lembrança. Para as autoridades, a prática não apenas favorece a prostituição, como é também apelativa para o tráfico de seres humanos.

A coordenadora estadual do Escritório de Enfrentamento e Prevenção do Tráfico de Seres Humanos, órgão mantido pela Secretaria de Justiça do Estado (Sejus), Eline Marques, destacou que ainda é intenso o movimento doméstico de mulheres, envolvendo boates e casas de prostituição.

"O Escritório não é contra a prostituição, mas atua precisamente contra o tráfico, onde as mulheres são usadas por cafetões e cafetinas numa situação de total privação dos direitos. Nos depoimentos que temos apurado, há uma cooptação pelas próprias garotas, uma convidando a outra. Elas trabalham dentro de um preço padrão, para ninguém cobrar mais caro ou mais barato e assim afetar o equilíbrio da concorrência", afirma Eline.

Na praia de Iracema, fica evidenciado o que se pretende com a movimentação nas boates. "O que acontece aqui é uma divulgação dos ambientes. Ou seja, onde há uma maior demanda de homens por sexo pago, as mulheres ligam para as amigas de estados vizinhos, como Pernambuco e Rio Grande do Norte, passam aqui de 15 dias a um mês", afirma a coordenadora do Escritório. A regra tem sido a exploração, cárcere privado e a privação da liberdade e a mulher se tornado objeto do sexo. "Nosso trabalho é muito mais preventivo", ressalta.
MARCOS PEIXOTO
REPÓRTER
ENTREVISTAFamílias deixaram de frequentar bares e restaurantes, o que agravou a decadência do bairroA que se atribui o esvaziamento dos equipamentos de lazer na Praia de Iracema?

Acredito que o esvaziamento decorreu na demora da execução de obras de reforma e uma ação intensiva de atrair as famílias. As obras acarretaram muitos problemas, como poeira, barulho de trator. No final, tornou-se um lugar desagradável para o lazer e, sobretudo, para a moradia.
Mas só a reforma não foi suficiente para o esvaziamento da Praia de Iracema. Qual o motivo o senhor considera o mais relevante para isso?
O mais grave foi a permanência de boates, que ocuparam espaço na Praia de Iracema. São poucas casas, mas o suficiente para causar grande estragos, em vista do que atraem de negativo e a forma como afastam as famílias do bairro. Infelizmente, essa é a nossa realidade que ainda não foi combatida de forma efetiva.
Como a prostituição afetou as atividades dos comerciantes na Praia de Iracema?
A ação principal foi afastar as famílias. Afinal, a Praia de Iracema nunca foi violenta. A imagem mais forte é com relação a um lugar romântico, bucólico e que sempre foi um recanto do fortalezense para a moradia e o lazer.
A prostituição e o tráfico de drogas extrapolaram os limites para os comerciantes e moradores?

Sem dúvida. Aqui você encontra três ou quatro casas que contribuem para essa imagem negativa. Isso é muito fácil de ser resolvido, desde que de forma ordenada. Então, não deveria interferir num local reconhecido pelo seu aconchego e por fazer parte do coração boêmio da cidade.
Como aconteceu a degradação que afetou o empreendedorismo no bairro?
Afetou consideravelmente, não somente a mim, como outros empresários, donos de casas importantes e de renome, como o La Bohème, Cais Bar, La Trattoria, Geppos, que tinha bar, restaurante, churrascaria, e o que tem hoje naquele lugar? Apenas um terreno e um estacionamento. Isso trouxe prejuízos para fornecedores, profissionais, garçons e para todo o trade. Muitas pessoas padeceram do desemprego, quando era uma atividade extremamente produtiva e que todos saíam ganhando. Principalmente, os próprios moradores da Praia de Iracema.
Erivaldo Alves*
Dono do restaurante Sobre o Mar
FONTE-DN.

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