terça-feira, 9 de novembro de 2010

"NO BRASIL - Justiça Federal do Ceará determina suspensão do Enem"

Locais de prova espalhados por toda Fortaleza estiveram bastante movimentados, na tarde do último sábado, até mesmo três horas antes do início do Exame Nacional. Estudantes aguardavam ansiosos pelo início do teste.
FOTO: ALEX COSTA

A decisão atende à solicitação do procurador da República no Ceará Oscar Costa Filho, que ingressou com Ação Civil.

A juíza federal da 7ª vara do Ceará, Carla de Almeida Miranda Maia, determinou ontem, a imediata suspensão do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A magistrada acatou solicitação do Ministério Público Federal do Ceará (MPF-CE) que, através do procurador Oscar Costa Filho, ingressou com Ação Civil Pública pedindo a suspensão do certame.

Para o procurador da República, a decisão servirá para que se avalie, de modo mais profundo, soluções efetivas para o caso. "É ridícula e despreparada essa postura do Instituto. Ao optarem pela realização de novas provas, eles próprios dão o atestado de óbito do teste. Pois, em hipótese alguma, pode-se ter testes diferentes para o mesmo concurso. Além do que existem princípios que formam um concurso, um deles é a não identificação do aluno", declarou.

Críticas:
Em seu despacho, a juíza afirma que os erros de impressão, de montagem e de aplicação das provas foram tratados de forma "pífia" pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pelo exame. A magistrada questiona o posicionamento do órgão diante das denúncias de erros.

O Inep teria prometido estudar uma forma de realizar novas provas para candidatos prejudicados pelo caderno amarelo, ao passo que abriu prazo para recurso a todos que houvessem se sentido lesados na realização do exame.

A decisão da juíza federal se baseou no argumento de que o erro da impressão das provas prejudicou os candidatos. "O cartão de resposta tinha a mesma divisão de cabeçalho, porém a ordem desses mesmos cabeçalhos estava trocada". Além disso a magistrada escreveu em seu despacho, que as falhas registradas na aplicação das provas "não só confirmam o justo receio, manifestado pelo órgão ministerial, como vão além, tornando, concretizado o justo receito em erros palpáveis e bem delineados".

Em entrevista coletiva, na tarde de ontem, Costa Filho explicou que durante o período de suspensão do Enem, os órgãos responsáveis pelo concurso não poderão divulgar os resultados dos gabaritos e nem corrigirem as provas. "O Enem encontra-se congelado, vamos investigar muitas outras informações que chegam até nós", disse.

Conforme ele, o que ocorreu nas provas do Enem é caracterizado como um erro de direito e, por esse motivo, basta a apresentação do documento para comprová-lo, ou seja, a prova de comando errado.

"Quando o presidente Inep, Joaquim José Soares Neto, afirma que houve orientação para que os estudantes seguissem rigorosamente a numeração das provas, ele tenta mascarar o erro de direito, como se fosse um erro de fato. Porém é claro que a instituição foi quem errou, justamente ao dar o comando errado na hora de determinar o preenchimento do gabarito", explicou o procurador.

Com relação a solução apresentada por Soares Neto de inserir um espaço, no site, a partir de amanhã, para que os alunos que se sentirem prejudicados possam abrir um requerimento, o procurador disse que "essa atitude confere ao aluno o poder de arbitrar a sua nota. E para ser um processo justo é necessário a anulação", argumenta Costa Filho.

Além de buscar a anulação do concurso, o MPF-CE também questiona o contrato do consórcio Fundação Cesgranrio/CESPE, que ficaram responsáveis pela organização e aplicação do teste. "Temos que ir as origens de todo esse processo, por isso indagamos o porquê de não ter sido feito processo licitatório para realização do exame. Vamos investigar esse contrato, pois o achamos ilegal", explicou o procurador da República.

Em outubro último, o Ministério Público Federal no Ceará (MPF-CE) decidiu ingressar com Ação Civil Pública contra os organizadores do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A Ação visava garantir maior segurança na aplicação das provas. Mas o Inep garantiu que o Exército Brasileiro seria o responsável pelo armazenamento e pela segurança, enquanto um consórcio contratado faria a organização e a logística de aplicação da prova.

Segundo Costa Filho, os organizadores do exame decidiram atribuir a escolas de Ensino Médio, inclusive privadas, as tarefas de coordenar e também executar a aplicação do Enem. Dessa forma, as escolas onde seriam feitas as avaliações ficariam responsáveis pela guarda prévia e posterior dos testes.

Por isso, o procurador pediu à Justiça Federal que atribuísse às instituições públicas de ensino superior as responsabilidades de organização e aplicação do Enem. Para o MPF, a atribuição dessas tarefas a instituições diretamente interessadas nos resultados dos testes traria insegurança ao processo. "As próprias escolas não podem ficar com o exame. Não é difícil imaginar que, por um motivo ou outro, as provas sejam violadas".

O procurador acrescentou que o Exército Brasileiro iria realizar apenas o transporte das provas usadas no exame, trabalho que também seria feito pela Empresa de Correios e Telégrafos (ECT). "A coordenação e a aplicação das provas serão feitas pelas próprias escolas, o Exército não vai se envolver. Isso vai comprometer a segurança do Enem", frisou.

Na época o Inep explicou que o consórcio contratado pelo teria a responsabilidade de organizar a logística de aplicação da prova, incluindo contratação e treinamento da equipe, alocação de estudantes e aluguel dos postos de aplicação.

Segundo o órgão, todo o processo é feito seguindo requisitos de segurança máxima. Não há envolvimento de qualquer escola pública ou privada de ensino superior ou básico na organização do exame. Todo o trabalho é supervisionado por coordenadores locais de aplicação. Continua na página 12

Prejuízos:
21 mil cadernos de provas amarelos com defeito foram distribuídos no primeiro dia de prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Segundo gráfica RR Donnelley Moore

3,3 milhões de estudantes compareceram às provas do concurso. A previsão do MEC é que os inscritos concorressem a 83 mil vagas em 83 instituições federais de ensino

POSICIONAMENTO:
Sinepe-CE apoia decisão

Posicionando-se a favor não só da suspensão como também da anulação do Exame Nacional do Ensino Médio 2010 (Enem), o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Ceará (Sinepe-CE), Airton Oliveira, declara que somente com essas medidas será possível manter uma disputa democrática pelo ingresso dos candidatos nas universidades que optaram por utilizar a avaliação como processo seletivo.

Segundo Oliveira, as escolas juntamente com o sindicato já haviam alertado o Ministério da Educação (MEC) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) sobre possíveis problemas que poderiam vir a ocorrer no exame deste ano.

"É lamentável o que aconteceu. Alunos, escolas, pais e professores, todos estão bastante apreensivos sobre como essa situação será resolvida. Recebemos a notícia da suspensão com muita tristeza. Contudo, uma solução pela metade não é o ideal, por isso o exame deve ser anulado", enfatiza.

O presidente do Sinepe-CE destacou que a ocorrência do erro demonstra a falta de cuidado do consórcio Cesgranrio/Cespe, responsável pela realização do Enem, com relação à correção das provas. "Nós não esperávamos que erros de correção como esse pudessem acontecer em um exame importante e de abrangência nacional", afirma.

Credibilidade:
Para Airton Oliveira, com o erro, o Enem perde a confiabilidade e a credibilidade tanto perante os estudantes quanto perante as instituições de ensino.

Dessa forma, a relação de garantia de que tudo acontecerá dentro da normalidade durante a aplicação das provas é quebrada. "Todo ano o exame apresenta um problema diferente. Ficamos sempre nos perguntando: será que vai dá certo? Será que dessa vez vai funcionar mesmo?", comenta Oliveira.

Vulnerabilidade:
De acordo com o presidente, além do erro no caderno de gabarito, ocorreu ainda um problema com relação ao horário de entrega dos exames nos locais de prova. "Em alguns, as provas chegaram no dia anterior. Já em outros, duas horas antes da avaliação. Isso demonstra a vulnerabilidade da segurança e da operação logística do Enem".

Oliveira defende que o exame deve ser aplicado pelo Inep em parceria com as universidades, já que estas possuiriam experiência na aplicação de provas de vestibular. "Os consócios não têm trazidos bons resultados, pelo contrário. Eles ainda precisam aprender a aplicar com responsabilidade um exame dessa natureza", diz.

TRANSTORNOS:
Situação pode gerar mais estresse

"Imagine um atleta que vai às Olimpíadas, ganha uma medalha e depois descobre que a competição foi cancelada. Com os estudos é do mesmo jeito", comenta o professor e mestre em Educação Marco Aurélio Ribeiro. Com a comparação, o educador tenta demonstrar o grau de frustração e tensão por que podem passar os candidatos ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) com a suspensão - e possível anulação - do exame.

Conforme Ribeiro, os estudantes que se preparam para a prova já passam, naturalmente, por um processo estressante ao participar de uma competição exaustiva, que existe intenso preparo intelectual e físico.

Com a apreensão causada pela suspensão do exame, afirma, o desgaste mental pode se intensificar e resultar em outros tipos de complicações para os alunos. Segundo o professor, há casos de estudantes que emagrecem consideravelmente antes do exame ou que apresentam problemas intestinais, por exemplo.

Segundo o educador, um dos entraves que os estudantes podem passar a enfrentar é a perda da credibilidade do exame. Isso porque farão uma prova que, saberão, estará sujeita novamente a erros.

Para Marco Aurélio, o melhor que os estudantes podem fazer, agora, é aceitar o fato de que seu esforço no último final de semana pode ter sido em vão e que um novo processo terá início. Isso não quer dizer, contudo, que os candidatos devam dedicar-se exclusivamente aos estudos. Ao contrário, devem também buscar aliviar a pressão através de momentos lúdicos. Para isso, acrescenta, é importante que pais e instituições de ensino permitam aos estudantes terem instantes de lazer.

THAYS LAVOR E JÉSSICA PETRUCCI
REPÓRTER/ ESPECIAL PARA CIDADE.

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