segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

"MONSENHOR TABOSA - Ex-prefeito sob investigação"

Colocados em vários sacos plásticos, os documentos públicos permaneceram ´desaparecidos´ desde janeiro de 2009. Somente com a intervenção do Ministério Público a papelada foi achada
FOTO: DIVULGAÇÃO

Todos os arquivos da Prefeitura de Monsenhor Tabosa foram apagados dos computadores no fim da gestão passada. Agora, as autoridades começam a fazer uma devassa em busca de provas
FOTO: KID JÚNIOR
Delegada Marta Monteiro comanda a força-tarefa para investigar os crimes praticados no Município. O primeiro já está configurado. Trata-se de ´supressão de documento público´ FOTO: CID BARBOSA


´Chico Madeiro´ nega ter ocultado a documentação e critica a atual gestão municipal. Diz que as obras estão paradas
FOTO: KID JÚNIOR

Após quase dois anos de buscas, autoridades localizam documentos que haviam ´sumido´ da Prefeitura do Município
Uma força-tarefa composta por representantes do Ministério Público Estadual (MPE), Ministério Público Federal (MPF), Polícia Civil, Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) e Poder Judiciário investiga mais uma grave denúncia de desvio de verbas públicas no Ceará. Desta vez, o centro das atenções das autoridades é a Prefeitura do Município de Monsenhor Tabosa (a 320Km de Fortaleza), onde foi necessário o cumprimento de vários mandados de busca e apreensão para a localização de quase uma tonelada de documentos oficiais que haviam misteriosamente ´sumido´.

A papelada refere-se a toda a contabilidade da Prefeitura entre os anos de 2005 e 2008, quando o Município tinha como gestor o agora ex-prefeito Francisco Jeová Madeiro Cavalcante, o ´Chico Madeiro´. A suspeita das autoridades é o desvio de verbas públicas que pode atingir a cifra de R$ 5 milhões. O desaparecimento dos documentos e a sua posterior localização levaram à instauração de um inquérito policial já em andamento e que terá desdobramentos nos próximos dias.

Sacos:
Segundo apurou a Polícia, os documentos oficiais referentes a balancetes, contratação de pessoal e de serviços, empenhos, licitações, prestação de contas de verbas oriundas de programas do Governo Federal e outras movimentações financeiras foram descobertos escondidos em duas residências de pessoas ligadas ao ex-prefeito. O material teria ´desaparecido´ do prédio da Prefeitura na véspera da posse do atual gestor do Município, José Araújo Souto. Durante a madrugada, a papelada foi colocada em dezenas de sacos plásticos e levada por desconhecidos na carroceria de um caminhão.

Somente agora, quase dois anos depois, os documentos oficiais foram descobertos a partir de uma operação comandada pela delegada da Polícia Civil, Marta Monteiro, especialmente designada para investigar o fato. O trabalho de busca teve, ainda, a presença do promotor de Justiça, Fábio Manzano. Os mandados de busca e apreensão foram expedidos pelo juiz titular daquela Comarca, Alexandre Santos Bezerra Sá.

Parte da documentação estava escondida na residência da ex-mulher de ´Chico Madeiro´, Maria Pastora de Souza Cavalcante. O restante foi localizado em outra casa, que seria espólio do ex-vice-prefeito do Município, Dimas Rodrigues.

Por ordem judicial, a papelada agora está guardada no Fórum de Monsenhor Tabosa, mas, em breve, poderá ser transferida para a Prefeitura, que ficaria como fiel depositária.

Em entrevista à Reportagem na semana passada, a delegada Marta Monteiro informou que os próximos passos do inquérito serão os depoimentos a serem tomados na investigação.

Cadeia:
Embora ainda esteja no início da apuração, a delegada já caracterizou pelo menos um crime, o de ´supressão de documento´, previsto no artigo 305 do Código Penal Brasileiro, que diz: "destruir, suprimir ou ocultar, em benefício próprio ou de outrem, ou em prejuízo alheio, documento público ou particular verdadeiro, de que não podia dispor". A pena prevista é de prisão, de dois a seis anos, além de pagamento de multa, quando o documento for público.

Conforme a delegada, depois de um exaustivo trabalho, foi possível catalogar cada um dos documentos apreendidos. "Vamos ouvir todas as pessoas relacionadas ao fato, tanto da gestão anterior, quanto da atual. As responsabilidades serão apuradas", advertiu.

Na última sexta-feira a Reportagem esteve naquela cidade e ouviu a procuradora do Município, Antônia Ivone Barros Martins. Segundo ela, o ´desaparecimento´ dos documentos oficiais tem causado um prejuízo contundente à atual administração e, principalmente, à população de Monsenhor Tabosa.

Sem a prestação de contas de convênios e de programas do Governo Federal, como o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), relativos à gestão anterior, novos convênios não puderam ser assinados com a atual administração.

"As áreas de Saúde e de Educação foram bastante prejudicadas pelo fato de não podermos renovar os convênios em decorrência da falta de prestação de contas dos anteriores. Além disso, não há como solucionar as inadimplências. Algumas foram suspensas, pelo prazo de seis meses, mas, em seguida, tornam-se novamente ativas", explica a procuradora. Ivone Martins cita o caso do programa Bralf (Programa Brasil Alfabetizado), em que a população de Monsenhor Tabosa está sendo diretamente afetada.

Documentos:
A procuradora explica que, mesmo com a localização da documentação, há ainda o aspecto de que boa parte da papelada sofreu desgaste. Havia documentos rasgados, molhados ou apagados. Segundo ela, quando o atual prefeito assumiu o cargo, sua equipe deparou-se com uma grave situação. Todos os arquivos constantes nos computadores da Prefeitura haviam sido apagados.

A investigação policial deverá ser acompanhada pelo MPF e já vislumbra crimes graves. Além do ex-prefeito, o inquérito poderá ainda alcançar o filho de ´Chico Madeiro´, Vando Madeiro, que era o secretário de Administração do Município. Os depoimentos devem ser iniciados ainda esta semana.

ENTREVISTA:
Ex-gestor alega perseguição política

A reportagem conseguiu, no começo da tarde da última sexta-feira, localizar o ex-prefeito de Monsenhor Tabosa. Francisco Jeová Madeiro Cavalcante, o ´Chico Madeiro´, recebeu a equipe do Diário do Nordeste em uma casa simples, na periferia da cidade de Monsenhor Tabosa. A princípio irritado, o ex-gestor disse, depois, que aquela era uma boa oportunidade para defender-se das acusações que, para ele, são fruto da disputa política no Município.

Jeová Madeiro negou a acusação de ter dado ´sumiço´ aos documentos oficiais. "Toda a documentação em primeira via está guardada no almoxarifado da Prefeitura. Todas as segundas e terceiras vias foram guardadas num prédio cedido pelo espólio (do ex-vice-prefeito). Tenho declaração e documentos assinados, tudo guardado no prédio que foi cedido à Prefeitura", afirmou no decorrer da entrevista.

"Moro de aluguel. Pago 200 reais por mês. Sou pobre. Tudo isso que está acontecendo é perseguição política. Fui vereador duas vezes e prefeito. Posso falar, agora, escreva tudo aí do jeito que eu disser. Pode escrever que eu assino em baixo", disparou o político.

O ex-prefeito aproveitou para alfinetar a atual gestão de Monsenhor Tabosa. Segundo ele, praticamente todas as obras públicas naquele Município estão paradas e os serviços públicos de educação, saúde e até o transporte escolar para as crianças e adolescentes foram suspensos. "Isso aqui está uma calamidade. As estradas vicinais estão todas péssimas. O transporte escolar está há cinco meses atrasado. As crianças estão indo a pé para a escola. Seria bom que tivesse uma fiscalização. Tem mais, a merenda escolar só dá para uma semana. As obras federais (do PAC), como creches, estão paradas".

Críticas:
O ex-prefeito também levantou suspeitas sobre as licitações feitas pela atual gestão que, segundo ele, estão sendo todas vencidas por um ex-contador da Prefeitura, de nome Joel. Ele criticou ainda a Saúde do Município e a insegurança.

MINISTÉRIO PÚBLICO:
Ilicitudes são alvo de apuração no CE

Assim como em Monsenhor Tabosa, outras prefeituras de Municípios cearenses estão, neste momento, sendo alvo de investigações do Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), Controladoria Geral da União (CGU) e das polícias Estadual e Federal.

As operações ´Gárgula I´, ´Gárgula II´ e ´Província´, já detectaram o desvio de milhões de reais em verbas federais que acabaram não sendo aplicadas em favor da população. Vários gestores e ex-gestores respondem a processos por improbidade administrativa e outros delitos como peculato, malversação de verbas públicas, fraude documental e até formação de quadrilha. Nenhum está preso.

Prefeitos:
Somente na semana passada, os Ministérios Públicos Estadual (MPE) e o Federal (MPF) anunciaram o ajuizamento de ações contra mais duas prefeituras cearenses. O MPE, através dos promotores Elizabeba Rebouças Tomé Praciano e Francisco Lucídio de Queiroz Júnior, impetrou no dia 29 de novembro último uma ação de improbidade administrativa contra várias pessoas envolvidas em fraude em processo licitatório e enriquecimento ilícito, em licitações ocorridas no Município de Paracuru (a 100Km de Fortaleza). Segundo o MPE, a fraude decorreu na aquisição de produtos de informática. A investigação envolve três empresas.

Já o MPF ajuizou Ação Civil Pública contra o prefeito do Município de Tamboril (a 391Km de Fortaleza), José Jeová Souto Mota e o secretário de Saúde, Joaquim Gomes de Sousa Neto. Segundo o MPF, em, nota distribuída à Imprensa, "os dois gestores são apontados como responsáveis por uma série de irregularidades que implicaram em prejuízo aos cofres públicos".

FERNANDO RIBEIRO
EDITOR DE POLÍCIA DN.

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