sexta-feira, 30 de julho de 2010

"PRAIA DO FUTURO - Blitz flagra 34 crianças em trabalho informal"

NO CEARÁ, existem 294 mil pessoas de cinco a 17 anos de idade em situação de exploração de mão-de-obra.
FOTO: KID JUNIOR.
 
Segundo especialistas, jogos de futebol em estádios são um dos atrativos para esse tipo de crime.

A exploração do trabalho infantil é vista à luz do dia nas grandes Capitais e, muitas vezes, ignorada. No período de férias, a situação piora. Para se ter uma ideia, somente entre os dias 22 e 25 de julho, a Secretaria Municipal de Assistência Social de Fortaleza (Semas), o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), o Juizado da Infância e Adolescência e a Polícia Militar realizaram uma blitz na Praia do Futuro e identificaram 34 crianças em situação de trabalho infantil.

Segundo Alyne Ciarlini, coordenadora colegiada do Fórum Estadual pela Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente no Ceará (Feeti), aproximadamente 70% das crianças que foram identificadas trabalhando exerciam a função de catadores de lixo reciclável.

Evasão

Conforme ela, as férias escolares colaboram para aumentar o número de crianças nessa situação. A coordenadora explica que é possível comprovar isso diante da grande evasão nas atividades realizadas pelo Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). "Algumas entendem que, durante o tempo livre, precisam ajudar os pais, outras vão para as ruas obrigadas por parentes, amigos e até vizinho", ressalta.

Para Alyne, existem pontos estratégicos na Capital nos quais é fácil identificar a presença de crianças trabalhando. São feiras livres, rodoviárias, festas, e, durante as férias, as praias são as mais procuradas pelo exploradores do trabalho infantil. "Elas vendem queijo e coco verde, catam latinhas e, no pior dos casos, são exploradas sexualmente. É preciso erradicar essa prática investindo em políticas públicas", ressalta.

No entanto, segundo o procurador do Trabalho Antônio de Oliveira Lima, titular no Ceará da Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho Infantil, as políticas públicas voltadas para as crianças no Estado não são suficientes e as existentes não possuem qualidade. Já que, conforme ele, crianças engajadas em projetos de erradicação do trabalho infantil continuam trabalhando.

Para se ter uma ideia dessa realidade, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), no Ceará, são 294 mil crianças e adolescentes de cinco a 17 anos, 60 mil só em Fortaleza, em situação de trabalho infantil. Desses, apenas 27. 477 estão matriculados no Peti, ou seja, 9,3%.

Pobreza

Para ele, essa situação se torna um círculo vicioso, pois, no futuro, os filhos das crianças que trabalham hoje irão reproduzir a ação de seus pais e prolongar essa triste realidade. "O trabalho infantil não tem como consequência a pobreza, mas é um financiador dela. Sem educação, nossas crianças não têm nenhum futuro profissional e continuarão disseminando a miséria no mundo".

Na tentativa de erradicar ou, pelo menos, diminuir o número de crianças em situação de trabalho, pessoas como Mariano Penha, educador social há quatro anos, desenvolvem tarefas significativas. De acordo com ele, mensalmente, são realizadas campanhas em prol da erradicação do trabalho infantil em diversos pontos da Capital, além do acompanhamento das famílias das crianças nessa situação ou matriculadas no Peti.

Segundo ele, em todas as Secretarias Executivas Regionais da Capital existem instituições credenciadas no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. Ele explica que são realizadas atividades esportivas e culturais no contraturno da escola. Além disso, as famílias cadastradas recebem um benefício do governo para que elas estejam matriculadas no programa.

KARLA CAMILA
REPÓRTER

A opinião do especialista

Férias escolares
Antônio de Oliveira Lima*

Na próxima semana, quando retornarem às aulas, muitos alunos serão convidados a relatar, por escrito, ou verbalmente, os acontecimentos que marcaram suas férias. Alguns falarão de viagens e outros relatarão festas, banhos de mar e outras brincadeiras. Entretanto, haverá aqueles cujas férias foram apenas escolares, pois continuaram trabalhando e em dobro, isto é, no turno e no contraturno escolar.

Apesar de registrar alguns avanços, os 20 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) evidenciam que as políticas publicas de atendimento a criança e ao adolescente no País são implementadas em quantidade e qualidade insuficientes e que a prioridade absoluta de que trata a Constituição Federal e o ECA ainda não foi assumida pela maioria dos gestores públicos.

Por isso, é que ainda existem 4,5 milhões de crianças e adolescentes em situação de trabalho no Brasil. Muitas dessas crianças e adolescentes estão nas chamadas piores formas de trabalho infantil, tanto as visíveis, como a coleta de material reciclável, quanto as invisíveis, como o trabalho doméstico. A maioria dos trabalhadores infantis estuda, mas não consegue um bom rendimento. Muitos abandonam a escola nas séries iniciais. Entre 14 e 17 anos, 25% deixam de frequentar a instituição escolar em razão do trabalho. Assim, salvo raras exceções, crianças e adolescentes que nunca foram à escola ou a abandonaram em razão do trabalho se tornaram, quando adultos, vítimas dos mesmos males sociais que atingiram seus pais e, desde cedo, seus filhos serão igualmente explorados no trabalho.

*Procurador do Trabalho.

FONTE: DN.

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